sexta-feira, 5 de outubro de 2018

O 5 de Outubro

Neste dia, a maior parte das pessoas deste país levanta-se como noutro dia qualquer - possivelmente um pouco mais bem dispostas, dado o facto de hoje ser um feriado nacional - e tenta desfrutar, ao máximo, do descanso simpático de fim-de-semana prolongado que este feriado proporciona. Deste luxo o cidadão europeu pode gozar (o de um feriado ou de um fim-de-semana) graças aos avanços no domínio dos direitos laborais, conseguidos pelas frentes políticas combatentes ao longo de décadas, não sendo o cidadão mais um farrapo nas mãos da indústria, como sucedia no Século XIX, sendo hoje algo um pouco melhor que um farrapo, mas não bom o suficiente, ainda assim. E irónico é estar eu a escrever sobre conquistas no mundo do trabalho, estando precisamente neste momento toda uma classe profissional em luta, na capital Lisboa, reivindicando o vencimento em falta, de 9 anos e mais alguns dias de trabalho, que o presente Governo Constitucional da República Portuguesa, por enquanto, ainda não se encontra preparado para devolver. Mas sobre a importância incontornável e basilar, para uma civilização, da classe dos professores noutra hora, agora sobre este feriado...

O dia 5 de Outubro é, na minha portuguesa opinião, de longe, a mais importante e quase sagrada data da História desta quase milenar nação. Deveria ser o 5 de Outubro e não o 10 de Junho o Dia da Nação. É aquele dia em que, caso não houvesse pessoas idiotas e historicamente amputadas, nunca geraria discussão sobre a sua celebração. Por um lado, celebramos a revolucionária implantação da República, que é a nossa garantia, juntamente com a Constituição de 1976, de que vivemos naquele que é, possivelmente, um dos países mais democrático do mundo. República é também a nossa garantia de que o Chefe de Estado português é eleito num sufrágio universal directo. Se este país não fosse uma República, se fosse uma Monarquia, seria Chefe de Estado um aristocrata qualquer que tudo o que tem é uma linhagem que recua séculos (por vezes nem isso), linhagem essa, e feitos históricos protagonizados por essa linhagem, com a qual o aristocrata no trono nunca teve objectivamente nada a ver, e aristocrata no trono esse que legaria a Chefia da Nação ao seu descendente mais velho, indo assim sucessivamente, como se a Nação Portuguesa fosse uma corporação económica qualquer na qual a direcção da corporação era passada de pai em filho, sempre dentro da mesma família. Mas reconfortemo-nos, portugueses, que numa República como a nossa, tal ataque aos valores democráticos não pode acontecer. 

Numa nota curta (que talvez não será assim tão curta), com o devido respeito àqueles que procuram um Reino, nunca percebi qual o objectivo dum adulto, com mais de 18 anos, ter tamanha e fabulosa adoração por um conjunto de monarcas da História Moderna, que tudo o que fizeram foi arruinar o próprio regime que governavam. Eu ficaria muito feliz se todos os poucos monárquicos portugueses compreendessem que não tem qualquer sentido a adoração que têm por Carlos I ou o seu filho Manuel II. Se os nossos últimos Chefes de Estado, em tempos reais, não fossem tão medíocres e impopulares, a monarquia nunca tinha caído, pelo menos tão cedo. Olhando para nações como a Inglaterra, a Holanda, a Bélgica, a Suécia, ou o Japão - não falo dos Estados Unidos de Castela (é o nome que eu dou ao país vizinho a que chamam Espanha) porque, na minha convicção, o monarca Filipe VI tem os dias contados - observamos que estas são monarquias estáveis porque os seus sucessivos monarcas tiveram a inteligência de preservar e modernizar o regime. O mesmo, felizmente, não aconteceu em Portugal.

Todavia, por outro lado, o 5 de Outubro não é somente sobre a República, daí a universalidade lusitana da sua celebração. O 5 de Outubro celebra também o aniversário histórico da Nação Portuguesa, pois foi no dia 5 de Outubro de 1143 (fazendo a conversão para o Calendário Gregoriano, e que os republicanos revolucionários de 1910 terão tido em conta) que o Rei Fundador Afonso Henriques nos garantiu porto seguro neste canto, no extremo ocidental da Península Ibérica e da Europa. E hoje, não a República Portuguesa (essa comemora uns já experientes 108 anos), mas sim Portugal celebra 875 anos, e tudo o que tenho pena é de já não estar cá, dentro de 125 anos, quando a Nação celebrar o seu primeiro milénio... se celebrar, obviamente. Bem, muitos parabéns a um dos Estados mais antigos do mundo, e aquele que é, em pleno Século XXI, um dos estados mais democráticos do Globo Mundo.

Portanto, é com a celebração desta mega efeméride, deste aniversário duplo, que me despeço do meu leitor, que certamente será português, e que terá um igual amor por este território a que chamam Portugal. Igual amor à República é que já é mais difícil, sendo eu um republicano ferrenho, para não esquecer que conheço uns quantos monárquicos que não ficarão, certamente, totalmente satisfeitos com este texto. É terminando este texto, enquanto ouço música consideravelmente atípica ao tema presentemente discutido, desde Supertramp e Jeff Buckley, até The Smiths e The Doors, que desejo um feliz 5 de Outubro a todos, e desculpem lá as farpas atiradas à Monarquia. Como republicano tenho de defender o vermelho, verde e esfera armilar, (ia também mencionar o hino, mas desisti porque assim tinha de mencionar, também, o Escudo, mas já não há Escudo, foi-nos roubado)... mas se não quiserem desculpar as farpas, não desculpem.

Menções honrosas a alguns dos portugueses históricos que mais admiro: Rei Afonso I, Rei Dinis I, Rei João II, Rei Pedro V, O Marquês de Pombal, José Relvas, Teófilo Braga, Luís de Camões, Fernando Pessoa, Miguel Torga, José Régio, José Saramago, Álvaro Cunhal

4 comentários:

  1. Os monarcas da História Moderna arruinaram o próprio regime no qual governavam????
    Não deves saber quantos governos teve a República! É a crise em que vivemos à décadas deve ser pura ficção! Em fim...

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    1. Viva a Pátria, Viva o Rei, Viva o Povo!

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    2. Enfim*
      Oliveira, vamos aos factos. Sei quantos governos teve a Primeira República: excluindo a Ditadura do Sidónio, 38 num espaço de 16 anos, segundo os meus dados - algo gritante sem dúvida. Quanto aos monarcas: Desde a crise dinástica do século XVI, aquando do desaparecimento de Sebastião I, que o país nunca mais esteve propriamente direito. Tivemos uma pessoa de idade avançada a reinar durante 2 anos, que era por acaso o Inquisidor-Mor do Reino (chills up my spine). Depois tivemos um domínio castelhano de 60 anos porque a nossa independência não conseguiu ser assegurada. Depois tivemos 28 anos de rara beleza em que conseguimos repelir os Império invasor - que estava a combater em várias frentes, não só connosco - numa longa guerra. Depois tivemos uma sucessão de Monarcas Déspotas que endividaram o Estado, o que é um feito quase absurdo. Muita coisa aponta para o seguinte facto interessantíssimo, a Coroa de Bragança era tão rica que, desde o reinado de João IV até, sensivelmente, ao reinado de José I, não foram cobrados impostos ao povo português... ainda assim a Casa de Bragança é capaz de levar o país à falência. Para não falar que o Absolutismo Régio era algo altamente desnecessário e absurdo, países como a Holanda ou a Inglaterra já tinham um parlamento. Indo mais para a História Contemporânea, tivemos um Monarca que abandonou o território português num momento de invasão, deixando o Povo quase indefeso. E depois tivemos a Carta Constitucional que é um dos maiores embustes na história democrática do nosso país, seguido de uma cascata triste de péssimos monarcas que permitiram que o Reino fosse ainda mais ao fundo, enquanto suas mordomias viviam nos mesmos luxos de sempre. A única coisa positiva neste ponto, a meu ver, foi Pedro V, mas morreu cedo, infelizmente. Carlos I foi um monarca altamente incompetente, altamente impopular, os artigos nos jornais em crítica à sua figura são das coisas mais hilariantes na História deste país - o próprio teve de suprimir o parlamentarismo e instaurar uma nova ditadura, e foi isso, na essência, que levou ao seu assassinato. Não conheço muitos historiadores e politólogos que pensem o contrário... Manuel II teve imenso azar, não era suposto que fosse este coitado Rei, e por isso mesmo é que a Monarquia não foi revitalizada, não havia boa liderança nem vontade de bem governar. A República pegou no país numa altura cataclísmica, não havia dinheiro nem ordem. Houve avanços, evidentemente, como a fundação dum Registo Civil, melhorias no saneamento básico e na educação - foi fundado o Ministério da Instrução Pública, que devia ser como se devia chamar o actual da Educação. Houve a introdução plena do voto feminino e não houve opressão de ideologias políticas. Claro que o sistema estava um caos, instável, dada a excessiva rotatividade no Executivo, e a Primeira Guerra Mundial foi uma autêntica bomba atómica na saúde do país - demograficamente foi uma tragédia... Houve mal e bem claro, mas não comparemos 16 anos de avanços e recuas a mais de 300 anos de desaparecimento da nossa relevância internacional e civilizacional, pelo menos é este o meu ponto de vista.
      Quanto à crise: nos últimos aninhos temos estado melhorzinhos, melhores de certeza do que esses grandes colossos que são os EUA ou o Brasil, eu pelo menos não gostava de viver nesses países mandados por loucos. E já sei que a Escadinávia está bem melhor que nós, mas isso não é por causa da Monarquia, tem tudo a ver com um continuo sistema socioeconómico social democrata e rejeição in fronteiras do neo-liberalismo. Há crise, continuam a haver problemas graves que não são estranhos à cena internacional, mas Portugal já esteve pior, para não falar que, como mencionei no texto, temos uma excelente Constituição... pelo menos é este o meu ponto de vista, sustentado por factos históricos.
      Bem, desculpa lá o testamento, mas eu gosto de ser muito atencioso com os meus interpeladores.

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